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Até 6 meses atrás eu ignorava totalmente o que eram os NFT`s, e só fui pesquisar depois que alguns amigos vieram me perguntar se eu trabalhava com isso. A pandemia aumentou a nossa vida online, e nessa onda muita gente (como eu) teve o seu primeiro contato com a tecnologia blockchain e seus ecossistemas.

Nesse artigo eu fiz um resumo do que são os NFTs, para que eles servem, como estão sendo utilizados em diferentes indústrias, alguns pontos de atenção como pirataria e impactos ambientais, e finalizo com uma perspectiva do que podemos esperar do futuro.

‘A mente que se abre a uma nova ideia jamais voltará ao seu tamanho original’.

– Albert Einstein

INTRODUÇÃO

Se você não sabe nada sobre esse assunto de blockchains e NFTs, eu tenho duas notícias boas para você:

  1. Você não está só. A maioria das pessoas do planeta também não sabem nada sobre isso, ainda estamos nos estágios iniciais da curva de adoção

  1. A adoção global das criptomoedas está crescendo de forma rápida. 2020 viu um crescimento de 881%, e até o final do segundo semestre desse ano o crescimento foi de 2300% comparado com 2019. A adoção institucional também está nos seus primeiros estágios.

O que são NFTs?

NFT significa Non Fungible Token ou Token Não Fungível, e a princípio, isso e nada pra mim era a mesma coisa. Então fui entendendo por partes:

Token é um arquivo digital criado dentro de uma blockchain.

Fungível é tudo que pode ser substituído por outro de mesma espécie e valor, como uma nota de R$50 que pode ser trocada por 5 notas de R$10 que dará no mesmo, ou seja, o dinheiro é um item fungível. Não fungível é aquilo que é único e indivisível, como o seu CPF,  ou uma obra de arte. 

Um token não fungível é um arquivo único, indivisível, irreplicável, imutável, que fica guardado em um livro de registros digital que usa tecnologia blockchain para comprovar a sua autenticidade.

Características específicas:

  • Certificado de posse digital: Quem tem NFTs na carteira, tem a posse comprovada de um arquivo autêntico, e pode guardá-lo pra sempre, ou vendê-lo quando quiser;
  • Imutabilidade: Os NFTs armazenam dados que não podem ser editados, como imagens, músicas, vídeos, gifs, assinaturas, mensagens…
  • Liberdade: Os NFTs são criados sem necessidade de análise ou autorização prévia;
  • Programabilidade: Os NFTs são códigos dentro de uma blockchain, e esses códigos podem ser programados para executar diferentes funções, por exemplo: quando eu crio uma arte em NFT, posso estabelecer quanto eu quero receber de royalties sempre que a minha arte for revendida;
  • Escassez: Todo NFT é único, e a sua autenticidade (bem como todo o seu histórico de transações) podem ser verificados na blockchain.

Exemplos de projetos:

Essa é uma tecnologia que, apesar de ainda estar na sua infância, já apresenta potentes aplicações para diferentes indústrias, como música, esportes, videogames, metaverso, ETF, real estate, arte, moda…

ARTE

Em alguns anos as crianças aprenderão sobre NFTs nas aulas de história da arte.

Quando uma obra de arte é vendida no mercado tradicional, o artista deixa uma grande porcentagem da venda com a galeria. Se um dia o comprador da sua obra a revender, o artista não receberá nada por isso. Nunca mais. Já quando o artista tokeniza a sua obra, ele pode definir a porcentagem de royalties que receberá sempre que aquela arte for revendida. Isso acontece de forma automatizada através de contratos inteligentes que foram criados dentro do NFT, e são imutáveis.

Os novos rumos que o universo da arte está tomando fez com que alguns players do mercado tradicional incluíssem os NFTs aos seus modelos de negócio.

A tradicional casa de leilões de arte Christie`s and Sotheby`s lidera esse movimento de adesão não só promovendo leilões de NFTs, como aceitando lances em Ether, a criptomoeda da blockchain Ethereum.  Em Março de 2021 eles realizaram a maior venda histórica de uma obra de arte digital. O artista norte americano Mike Winkelmann, mais conhecido como Beeple, vendeu a sua obra Everydays por impressionantes 69 milhões de dólares, e assim se tornou um dos artistas vivos mais valiosos do mundo.

Nada pode impedir que a imagem desse NFT seja baixada, replicada, editada… Mas apenas uma pessoa possui a obra original e pode revendê-la caso queira.
 

Everydays: the First 5000 Days –  Mike Winkelmann (Beeple)

Os  CryptoPunks também chamaram a atenção de muita gente. Trata-se de 10.000 personagens únicos criados algoritmicamente pela Larva Labs, dos quais 9.000 foram distribuídos gratuitamente. Hoje o exemplar mais barato não sai por menos de $235 mil. Algumas grandes instituições já estão de olho nesse mercado, inclusive a VISA já garantiu o seu próprio CryptoPunk.

CryptoPunks – Larva Labs

Imagine um clube em que a entrada é um NFT. Bored Ape Yacht Club é outra coleção que rapidamente atraiu a atenção de diversas celebridades, e viu um crescimento meteórico na sua popularidade e preços. Na primeira fornada de 10.000 unidades, os macacos entediados foram vendidos por 0.08 ETH cada ($190 na época), e hoje o mais barato não sai por menos de 59 ETH ($236.000). Quem poderia imaginar que em poucos meses de vida os Bored Apes ultrapassariam a marca dos 2 bilhões de dólares em valor de mercado, estariam à venda nos leilões da Sotheby´s, virariam a primeira banda formada por NFTs (apadrinhada pela Universal Music), fariam parceria com a Adidas, e dariam até umas festas

Rolling Stone x Bored Ape Yacht Club

ARTE URBANA 

A pandemia também levou ao cancelamento de festivais de arte urbana e exposições por todo o mundo, e alguns artistas urbanos encontraram no mundo virtual uma alternativa para expandirem os domínios da sua arte. 

O artista holandês Does criou sua galeria virtual na própria casa, desenvolveu uma nova linguagem de trabalhos usando minuciosos recortes em papel, e já tem os seus primeiros NFTs à venda. 

Digital Does

O artista norte americano Tristan Eaton botou a criatividade pra jogo, e usou o bom e velho marketing de guerrilha para divulgar seus NFTs. Ele espalhou algumas caixas de cereal com a sua arte por supermercados dos EUA, e quem achasse uma dessas caixas ganhava um NFT. 

Tristan Eaton

A artista mineira Rafa Mon teve recentemente o seu maior mural apagado, e resolveu ressuscitá-lo em forma de NFT no ambiente do metaverso. 

Rafamon

Punks in the city é um projeto que une a comunidade crypto à arte urbana selecionando renomados artistas (como os búlgaros Arsek & Erase) para pintar murais que integrem os Cryptopunks à cidade. A imagem de cada mural vira um NFT que é leiloado, e o lucro é usado para financiar a produção de outros murais com outros artistas.

Arsek & Erase

Streeth é uma plataforma focada em levar a arte urbana para a blockchain, e oferecer experiências de realidade virtual e realidade aumentada. 

Artistas urbanos estão acostumados a ver suas obras se deteriorarem/sumirem com o tempo. Tokenizar a arte urbana é uma forma de transformar o que era efêmero em perene, e isso abre um novo repertório de possibilidades criativas para os artistas.

MODA

Já que o NFT é uma ferramenta que comprova autenticidade e procedência, ele tem muito a oferecer ao universo da moda. Soma-se a isso a recente ascensão parabólica do metaverso e dos games, e abre-se assim uma nova e animadora perspectiva para o tradicional mercado das marcas de roupa.

A alemã Adidas, em parceria com o Bored Ape Yacht Club, o Punks Comic, e o Gmoney, criou o seu primeiro projeto NFT ´´Into the Metaverse“ e faturou 43 milhões de dólares em 72 horas.

A italiana Dolce & Gabbana lançou a sua primeira coleção de NFTs de itens físicos e digitais em um leilão que arrecadou 5.7 milhões de dólares.

https://twitter.com/UNXD_NFT/status/1445013118778761224?ref_src=twsrc%5Etfw%7Ctwcamp%5Etweetembed%7Ctwterm%5E1445013118778761224%7Ctwgr%5E%7Ctwcon%5Es1_c10&ref_url=https%3A%2F%2Ffinance.yahoo.com%2Fnews%2Fwearable-nfts-could-trigger-11-billion-record-quarter-100436479.html

Quando a norte americana Nike comprou a RTFKT, uma empresa de tecnologia especializada em criar itens colecionáveis e roupas digitais para metaversos e games, ela também já estava sinalizando a sua entrada nesse mercado.

https://twitter.com/RTFKTstudios/status/1470502799498792963?s=20

Mas nem só de marcas vive a moda, e outros players dessa indústria também já estão se posicionando nesse tabuleiro:

O Crypto Fashion Week é um evento de moda que acontece inteiramente online, com workshops, palestras, desfiles, reunindo uma comunidade de designers, artistas, e qualquer pessoa que se interesse por moda digital.

A DressX é um marketplace especializado em roupas virtuais. Eles trabalham com designers de moda criando coleções que só existem no mundo digital, e podem ser vestidas através da realidade aumentada.

A NFT Runway é uma plataforma que trabalha com marcas e designers promovendo desfiles virtuais das suas coleções de roupas-NFT, integrando metaverso, realidade aumentada e 3D.

O sucesso dos jogos play to earn trouxe a expectativa de um possível wear to earn, que levará o engajamento entre marcas e usuários para outro patamar.

Talvez seja só uma questão de tempo para que tenhamos um guarda roupa digital, para que os influencers virtuais sejam mais relevantes do que os de carne e osso, e para que o volume de vendas das roupas virtuais ultrapasse o das roupas de tecido. Quem viver, verá.

PIRATARIA

Onde rola dinheiro rola golpe, e a malandragem também está de olho  nas altas cifras que os NFTs estão movimentando. Novas tecnologias também trazem consigo novas formas de enganar pessoas, por isso é preciso estar atento a detalhes para evitar ciladas e não sair no prejuízo. 

Artes digitais podem ser facilmente baixadas, replicadas, compartilhadas, editadas, impressas, vendidas, revendidas, e os artistas que as criaram muitas vezes não têm controle algum sobre os rumos da sua obra na web.

A descentralização é uma faca de dois gumes. A liberdade e facilidade com que se pode criar um NFT é uma característica que facilita tanto a vida do artista quanto a do seu falsificador.

Enquanto alguns golpes podem ser toscos e fáceis de identificar, outros podem ser bem sofisticados e convincentes. Em Agosto deste ano um NFT falso do Banksy foi vendido por $336 mil, e o link para o leilão vinha do site do próprio Banksy que tinha sido hackeado mas ninguém sabia.

Para escapar dos golpes básicos de imagens copiadas da internet, basta entrar no Google e fazer uma pesquisa reversa de imagem para saber onde mais aquela imagem aparece na web, e quem a criou.

De tanto se repetirem, alguns golpes já ficaram manjados. Uma pesquisa feita pela Bolster, uma plataforma que utiliza inteligência artificial para prevenir fraudes, classificou e detalhou os principais tipos de golpe, entre eles:

  • Réplica de sites – O golpista cria um site idêntico a algum grande marketplace de NFTs; envia e-mails idênticos aos do marketplace, e quando o usuário clica em algum link desse e-mail, ele é direcionado para o site fake, e ali se sente à vontade para inserir suas credenciais de login e dados do cartão de crédito sem desconfiar que acaba de cair em um golpe. Esse golpe é conhecido Phishing, e ele também pode se apresentar de diversas outras formas;
  • Apropriação da identidade do artista e/ou de sua obra – O golpista cria um perfil idêntico ao do artista em alguma mídia social, passa a postar e interagir como se fosse o artista, e assim consegue vender NFTs falsos a baixos preços até que sua conta seja descoberta e suspensa. A melhor forma de evitarmos esse golpe é verificando as outras mídias sociais do artista, o site oficial, e assim comprovando se o NFT é legítimo ou não;
  • NFTs grátis – No universo crypto é comum que projetos distribuam parte dos seus tokens gratuitamente (airdrops) como estratégia de marketing para expandir a sua base de usuários. Naturalmente, os golpistas também se aproveitam dessa estratégia para aplicarem seus golpes. Geralmente no Twitter ou no Discord, o golpista envia mensagens em massa para os usuários dizendo que eles ganharam um NFT. Essa mensagem contém um link que direciona o usuário para a falsa página do tal NFT, que solicita ao usuário que conecte a sua carteira crypto, insira a sua frase chave e, pronto, perdeu. A melhor maneira de nos prevenirmos desse golpe é basicamente não clicando em nenhum link aleatório que recebemos na web;
  • Réplica de grupos institucionais – Aqui o golpista cria uma réplica do canal oficial de comunicação de alguma empresa. O Telegram e o Discord são os alvos preferidos para essa modalidade, e são infinitos os possíveis nomes de grupos oficiais falsos. Dentro desse grupo falso o usuário irá se deparar com uma comunicação convincente que o induzirá a clicar sem medo em links maliciosos que limparão a sua carteira. Para escapar dessa armadilha, vale procurar o link para o grupo no site oficial da empresa. Caso não tenha, vale conferir bem o nome do grupo e o número de membros antes de entrar.

Os golpistas continuarão encontrando novas formas de aplicar os seus golpes, não só com NFTs, mas com tudo que envolva compra online. Nós, usuários / consumidores, teremos que continuar nos atualizando se quisermos continuar aproveitando as maravilhas da tecnologia sem cair em golpes evitáveis.

IMPACTO AMBIENTAL

Esse é um tema que levanta debates calorosos, mas é importante deixarmos as emoções de lado para analisarmos os fatos sob diferentes perspectivas antes de formarmos a nossa opinião. 

A maior parte dos NFTs existem na blockchain do Ethereum, que consome mais energia do que alguns países.

O artista visual francês Joanie Lemercier parou de trabalhar com NFTs quando descobriu o consumo energético que eles geram.

A plataforma de arte ArtStation adiou a sua entrada no mercado dos NFTs depois de receber uma enxurrada de críticas por conta do consumo energético…

Tudo é uma questão de perspectiva, e esse consumo energético deixa de ser um problema quando nos aprofundamos no assunto, analisamos as premissas corretas, e então entendemos a dimensão dos benefícios que esse consumo energético proporciona.

Evoluir é sustentável. Enquanto o Ethereum 2.0 não chega com todos os seus upgrades, temos a opção de usar diversas outras plataformas mais sustentáveis. A criatividade pode seguir se divertindo sem peso na consciência.

FUTUROLOGIA

Quem não ouviu falar em NFTs durante 2021, provavelmente ouvirá em 2022.

Além de ser a palavra do ano, em 2021 os NFTs tiveram um crescimento meteórico tanto em capitalização de mercado, quanto na  adoção institucional: Visa, Nike, Adidas, Dolce & Gabbana, NBA, Fórmula 1, Universal Music… são os primeiros sinais de que algo grande está por vir. 

Mas nem tudo são flores, os golpistas também irão se reinventar, e provavelmente seguiremos conhecendo novas modalidades de trapaça. 

Não são raros os casos de artistas que têm suas obras vendidas como NFT sem autorização. Marketplaces que não tem um bom sistema de verificação facilitam a vida do golpista. Para um produto que tem a autenticidade como diferencial, falsificar deveria ser mais difícil. No Twitter, a conta @NFTheft documenta esse tipo de golpe.

A indústria sempre encontra formas de se defender e avançar. A Adobe, por exemplo, está desenvolvendo uma funcionalidade para que o Photoshop insira no arquivo final de cada imagem um metadado com todo o histórico da criação daquela imagem. Essa será uma importante ferramenta para comprovar da procedência e autenticidade daquele arquivo quando ele estiver à venda em marketplaces como a Rarible

 É tempo de avançar. Soluções disruptivas tendem a surgir com cada vez mais frequência, como o primeiro marketplace de NFTs médico científico, criado pela Aimedis. Através da plataforma, os pacientes poderão transformar seus dados médicos em NFTs, e vendê-los para companhias farmacêuticas. Na economia digital o dado é o bem mais valioso, e isso é uma ótima notícia para os donos dos dados: nós. 

Os NFTs serão cada vez mais utilitários e menos especulativos. Podem vir com funcionalidades que vão além do mundo digital, e dão acesso a experiências e produtos na vida real. O rapper norte americano French Montana lançou o Coke Boys Sneakers, sua coleção de tênis/NFTs com 3.000 pares digitais e 500 pares físicos. A intenção não é vender massivamente, e sim criar um artigo de colecionador. Quanto mais escasso, mais valioso.

Agora imagine tokenizar a si próprio como forma de financiamento. Foi assim que o jovem francês Alex Masmej arrecadou 20 mil dólares para se mudar de Londres para o Vale do Silício e fundar a sua startup. Quem tem o token $ALEX vai ganhar parte do seu salário por 3 anos, e poderá votar em decisões da sua vida pessoal. Será que em breve veremos pessoas criando NFTs de si mesmas?

O futuro é imprevisível, mas de vez em quando podemos ler alguns sinais e projetar possíveis cenários. Estamos migrando para o metaverso, a revolução será criptografada, e a disrupção é garantida. 


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Sobre o autor:

Marcel Serrano é ilustrador, se graduou em Comunicação Visual na UFRJ, se pós graduou em Design Estratégico na ESPM, se especializou em estamparia desenhando por 9 anos para algumas das principais marcas de moda do Rio de Janeiro. Atualmente vive em Barcelona, de onde trabalha como freelancer criando identidades visuais, estampas, ilustrações, murais, e buscando parcerias que gerem impactos positivos.


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Marcel Serrano

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